Um dominó de golpes: qual será o próximo?

Depois do Mali, do Chade, da Guiné-Conacri, do Sudão, do Burkina Faso, do Níger e do Gabão, África e o resto do mundo interrogam-se: que outros países e líderes estão na mira dos militares? Entre os mais prováveis, um deles pertence à CPLP e outros fazem fronteira com antigas colónias de Portugal. (Ler maid | Read more…)

Sylvanus Olympio, o primeiro presidente do Togo e a primeira vítima de um golpe militar em África. Foi assassinado em 1963, em parte porque queria distanciar o país da França, a ex-potência colonial.
© Memorial Wall of Africa

Na madrugada de 13 de Janeiro de 1963, o presidente Sylvanus Olympio foi assassinado à porta da embaixada dos Estados Unidos em Lomé, quando soldados que combateram ao lado da França nas guerras da Indochina e da Argélia, furiosos por não terem sido integrados no exército nacional, o tentavam prender. Foi assim que o Togo independente se tornou pioneiro dos golpes de Estado na África Ocidental subsariana.

Olympio queria distanciar o país da ex-potência colonial, que adquirira dois terços do Togo após a I Guerra Mundial. Em 12 de Dezembro de 1962, fizera aprovar uma lei para criar uma moeda nacional togolesa que substituiria o franco CFA.

Após o seu assassínio, quem assumiu a presidência foi o rival Nicolas Grunitzky, leal a Paris, mas em 1967 também ele seria deposto num segundo golpe, ambos liderados por Gnassingbé (então Étienne) Eyadéma.

Amigo pessoal de Jacques Chirac, Eyadéma governou durante 38 anos, primeiro em regime de partido único, até aos anos 1990 – um período em que cometeu massacres e provocou a fuga de milhares de togoleses – e depois num sistema multipartidário também violento e fraudulento.

Morreu em 2005 e, com apoio do exército, sucedeu-lhe imediatamente o filho, Faure Essozimna Gnassingbé Eyadéma. Este, para silenciar os críticos, candidatou-se no mesmo ano a eleições, permanecendo desde então no poder depois de, sucessivamente, reeleito em escrutínios duvidosos, em 2010, 2015 e 2020.

No Togo, Faure Gnassingbé “adaptou e reformulou as estratégias” do pai, Gnassingbé Eyadéma, cuja ditadura “assentava na repressão, no nepotismo e num bizarro culto da personalidade”.
© Patrick Kovarik | AFP | Getty Images | okayafrica.com

Ao contrário do pai, que era militar de carreira, o filho formou-se em Economia em Paris e em Washington, mas, se Gnassingbé Eyadéma “assentava [a sua ditadura] na repressão, no nepotismo e num bizarro culto da personalidade”, Faure Gnassingbé também “adaptou e reformulou essas estratégias”, como escreve Anja Osei, académica especialista em elites políticas africanas, no ensaio Like father, like son? : Power and influence across two Gnassingbé presidencies in Togo.

Porque o Togo permanece um Estado militarizado e é um dos países mais pobres de África (mais de 50% da população vive abaixo do limiar da pobreza, com menos de 1,25 dólares por dia), debatendo-se com uma escalada de terrorismo, sobretudo na região norte, fronteiriça com o Burkina Faso, vários analistas admitem que poderá ser um das primeiras peças a cair no dominó de golpes que abala o continente.

“A família Gnassingbé vê o poder político como um direito de nascença”, critica no site The Elephant a directora da Liga Civil Togolesa, Farida Bemba Nabourema. “Os Gnassingbés não controlam apenas as eleições, eles são as eleições. Em 2025 [as próximas presidenciais], esta família estará no poder há 59 anos. É impressionante que 97% dos cidadãos do país só tenham conhecido esta dinastia, já que apenas 3% da população tem mais de 50 anos.”

Nabourema nota que o descontentamento – houve gigantescos protestos em 2017 –, “não se limita às massas”, havendo também “uma distinta sensação de desconforto nos corredores do poder”. Várias figuras políticas e militares foram afastadas nos últimos anos, incluindo Felix Kadanga, cunhado de Faure Gnassingbé e ex-chefe das Forças Armadas. A viúva do irmão mais velho, Ernest Gnassingbé, também perdeu o cargo de ministra da Defesa menos de um ano após ser nomeada.

No Togo, acrescenta a activista Nabourema, estão cumpridos todos os requisitos que costumam precipitar golpes: “insegurança generalizada, insatisfação popular, ausência do Estado de direito, pobreza persistente, instituições nacionais frágeis”. E se, globalmente, os golpes são vistos como ameaça à democracia, no Togo, sob domínio de um autocrata de 57 anos que “abafa a liberdade de expressão”, uma intervenção militar “poderá ser um potencial catalisador de mudança democrática”.

Paul Biya, presidente dos Camarões, passa mais tempo numa “suite de luxo do Hotel Intercontinental de Genebra, com vista para o imaculado lago da cidade” do que em Yaoudé, o centro do poder, noticiou o diário britânico Financial Times.
©Antoine Gyori | Corbis | Getty Images | britannica.com

Outros candidatos a ser contagiados por intervenções militares no continente são os Camarões, Estado vizinho de São Tomé e Príncipe; a Guiné Equatorial, que é membro da Comunidade de Países de Língua Portuguesa (CPLP); a República do Congo, que a sudoeste faz fronteira com a província separatista angolana de Cabinda; a República Democrática do Congo (RDC) que tem Angola na sua fronteira sul; o Senegal, que partilha fronteiras marítimas com Cabo Verde e é vizinho da Guiné-Bissau; a Eritreia; e o Uganda, segundo uma análise da Stratfor, think-tank norte-americano de informação estratégica e geopolítica.

Nos Camarões, cujo presidente, Paul Biya, passa mais tempo numa “suite de luxo do Hotel Intercontinental de Genebra, com vista para o imaculado lago da cidade” do que em Yaoudé, como noticiou o diário britânico Financial Times, mas o filho, Emmanuel Franck Biya ainda aguarda a bênção do pai para lhe suceder.

Porque, refere a Strafor, há outros candidatos, como o ministro das Finanças, Louis-Paul Motaze, o director do Gabinete Civil da Presidência, Samuel Mvondo Ayolo, e o titular da pasta da Economia, Alamine Ousmane Mey.

Se o nonagenário Paul Biya, chefe do Estado há 41 anos depois de ter sido primeiro-ministro de 1975 a 1982, morrer sem escolher um herdeiro, as elites do partido governamental, Movimento Democrático Popular dos Camarões, “vão disputar a liderança e as oportunidades a ela associada para poderem enriquecer”, prevê a Stratfor.

“Para ‘evitar uma crise política’ e aproveitar o caos gerado por lutas de poder, líderes militares oportunistas poderão tentar assumir o controlo, antes ou depois da morte ou incapacidade” do presidente, um cristão do Sul que sucedeu a um muçulmano do Norte, Ahmadou Ahidjo.

Franck Biya ainda aguarda a bênção do pai para lhe suceder na presidência dos Camarões, até porque as elites do partido governamental querem “disputar a liderança e as oportunidades a ela associada para poderem enriquecer”, segundo previsões da Stratfor.
© Ludovic Marin | AFP | Le Monde

O Financial Times não vê iminente um golpe nos Camarões, porque o regime está a blindar-se. No mesmo dia em que Ali Bongo caiu no Gabão, em 30 de Agosto, houve uma “significativa remodelação nas forças armadas”, para lembrar a potenciais golpistas “os riscos de cercarem com tanques o palácio presidencial”.

“Uma das razões por que Biya se tem conseguido manter no poder foi porque dividiu deliberadamente as forças armadas em diversos ramos, como medida preventiva”, confirma o grupo católico sul-africano Denis Hurley Peace Institute (DHPI), citado pela Radio France Internationale.

“O país tem uma gendarmerie, um exército regular e uma Guarda Nacional Presidencial, assim como uma Brigada de Intervenção Rápida, conhecida pelo acrónimo francês BRI. A par com os ajustamentos que fez recentemente nas chefias do sector da defesa, Biya cancelou qualquer possibilidade de um golpe militar acontecer em breve nos Camarões. Irá manter-se no poder até que alguém defina uma estratégia diferente para o desalojar.”

À RFI, Immanuel Tatah Mentan, professor camaronês de Ciência Política, concorda que não haverá um golpe para já, mas por motivos diferentes: “Os militares não são movidos pelo patriotismo, mas por lealdades étnicas. Obedecem a comandantes, não servem a nação. Torturam, oprimem, roubam os pobres. Como é que eles poderiam, subitamente, tornar-se protectores do povo? Os militares também não têm formação para serem líderes, como poderiam eles governar?”

No entanto, segundo a rede de sondagens Afrobarometer, 66% dos camaroneses apoiariam uma intervenção militar, o que, segundo a RFI, “sugere frustração” com um regime que já sobreviveu a dois golpes.

Na Guiné Equatorial há uma “guerra de sucessão” entre Teodoro Obiang, o presidente (ao centro), e os seus dois filhos, Gabriel (à esquerda) e Teodorín, que parece estar em vantagem.
© Fotomontagem: Ronald Zak| AP | SIPA; Ludovic Marin | AP | SIPA; Frank Franklin II | AP | SIPA – Jeune Afrique

Na Guiné Equatorial, onde Teodoro Obiang Nguema Mbasogo, de 81 anos de idade e 44 de poder, cumpre o seu sexto mandato como presidente – uma longevidade política sem igual no resto do mundo –, “não há um sucessor imediato, o que também abre a porta da um golpe se houver uma crise de sucessão”, observa a Stratfor.

Em 2004, mercenários recrutados por financeiros britânicos, entre eles Mark Thatcher, filho da defunta primeira-ministra Margaret Thatcher, planearam substituir Obiang por Severo Moto Nsá, dirigente da oposição no exílio, mas foram detidos no Zimbabwe antes de concretizarem o golpe.

Como candidato do seu Partido Democrático da Guiné Equatorial (PDGE), que participou nas eleições de Novembro de 2022, em coligação com outras formações políticas. Obiang conquistou “94,9% dos votos”, uma “vitória” validada pelo Tribunal Constitucional do país. Em 2016, quando foi reeleito com “93,7%”, havia sinais de que Obiang estaria a preparar-se para ceder o poder a um dos filhos, o vice-presidente Teodoro Nguema Obiang Mangue.

Conhecido como Teorodín, Nguema Obiang Mangue foi forçado pelos EUA a devolver milhões de dólares em bens, desde mansões a carros de luxo, condenado pela França a uma pena suspensa de 3 anos e ao pagamento de uma multa de 30 milhões de euros, investigado em Madrid por ter raptado e torturado dois cidadãos espanhóis em 2020.

Entretanto, este ano, Teorodin mandou prender um meio-irmão, Ruslan Obian Nsue, ex-director de uma companhia aérea estatal, que vendeu um avião a uma empresa espanhola e embolsou o dinheiro da transação.

Na “luta pela sucessão”, embora em desvantagem, parece estar também Gabriel Mbega Obiang Lima, 48 anos, filho da segunda mulher do presidente, Celestina Lima, originária de São Tomé e Príncipe. Formado nos Estados Unidos, é desde Fevereiro ministro das Finanças, Economia e Planeamento.

Por enquanto, a guarda presidencial parece achar demasiado cedo proceder a uma transição de poder, dado que o país, rico em ouro, petróleo, diamantes e gás, mas onde 70% da população vive na pobreza, está em recessão económica e depende de ajuda externa. 

“Embora o aparelho de segurança seja leal a Obiang e ao seu círculo restrito, desde há décadas, uma crise de sucessão poderá criar divisões e concorrência, se algumas facções perceberem que as estruturas de poder estão em fluxo”, analisa a Stratfor.

Nesta antiga colónia espanhola que integra a CPLP como “membro de pleno direito” desde 2014, Obiang chegou à presidência em Malabo, depois de, em 1979, ter derrubado o tio, Francisco Macías Nguema. Mandou-o executar depois de o acusar de genocídio contra o povo Bubi e, desde então, governa como um dos piores ditadores de África.

O octogenário Denis Sassou Nguesso é presidente da República do Congo desde 2002 (depois de já ter exercido estas funções entre 1979 e 1992), graças a mudanças na Constituição que lhe têm prolongado os mandatos.
© Anis Mili | Reuters

Na República do Congo, circularam rumores, rapidamente desmentidos, de um golpe contra o presidente, Denis Sassou Nguesso, quando este aterrava em Nova Iorque para participar na Assembleia-Geral das Nações Unidas.

Se o regime mantém aparentemente o controlo, observa a Stratfor, a especulação nas redes sociais “reforçou a sua vulnerabilidade” depois de os militares terem derrubado Ali Bongo no vizinho Gabão. Édith Lucie Bongo Ondimba (1964-2009), filha de Nguesso, foi primeira-dama do Gabão, depois de se casar com Omar Bongo, o pai de Ali, em 1989.

O ex-oficial Nguesso, que em Novembro completará 80 anos, foi um dos golpistas que, em 1968, derrubou o presidente, Alphonse Massamba Debat, para o substituir por Marien Ngouabi. Este fez dele director da Segurança do Estado aos 30 anos e ministro da Defesa aos 32.

Nguesso é chefe do Estado desde 2002 (depois de já ter exercido estas funções entre 1979 e 1992), graças a mudanças na Constituição que lhe têm prolongado os mandatos.

“Se Nguesso morrer ou ficar incapacitado antes de escolher um sucessor”, explica a Stratfor, “as forças políticas na oposição, incluindo o Partido da Democracia e Desenvolvimento, o Movimento dos Republicanos e o Partido do Povo, poderão exigir eleições livres para escolher o próximo presidente. No entanto, dado que “são as elites que dominam tudo”, o sucesso de tais exigências irá depender dos níveis de apoio popular”.

Apesar de haver um grande descontentamento na sociedade, sobretudo devido à “riqueza extravagante exibida pela família Nguesso”, não é possível perceber se será possível organizar uma revolta capaz de destronar o sistema político. E, como noutros países, “líderes militares golpistas poderão também tentar extrair dividendos desta incerteza”.

Félix Tshisekedi recolheu mais de 70% dos votos nas eleições presidenciais de 2023, mas os militares na República Democrática do Congo estão divididos e podem cair na tentação de um golpe, admitem alguns analistas regionais.
© Junior D. Kannah | AFP | France 24

Os analistas estão igualmente com os olhos postos na República Democrática do Congo (ex-Zaire), onde diversos factores – em especial divisões nas forças armadas e a guerra nas províncias orientais de Iuri, Kivu Norte e Kivu Sul, de onde 5,5 milhões de pessoas foram deslocadas e mais de 26 milhões precisam de ajuda humanitária – poderão deixar o presidente em Kinshasa, Félix Tshisekedi, “vulnerável a um golpe” antes das eleições de 20 de Dezembro.

A campanha eleitoral começa a 19 de Novembro e a Human Rights Watch já constatou “prisões arbitrárias e restrições à liberdade de expressão e acção” de dirigentes da oposição, entre eles Moïse Katumbi, líder do Ensemble pour la Republique, e Martin Fayulu, candidato da coligação Lamuka e suposto vencedor das eleições de 2019, que deram a presidência a Tshisekedi.

Os militares estão divididos entre os que são leais ao anterior presidente, Joseph Kabila, rival de Tshisekedi, e os que são fiéis aos líderes da oposição no Sudeste e Leste do país. Alguns poderão ser tentados a derrubar o governo, sobretudo se houver a percepção de que as consequências serão mínimas ou que as eleições serão, mais uma vez, fraudulentas e violentas. [Isto não aconteceu: as eleições foram consideradas pelos opositores “uma fraude”, mas só um candidato as contestou (em vão) em tribunal: Tshisekedi recolheu mais de 70% dos votos.]

O presidente do Senegal, Macky Sall prometeu afastar-se do poder em Abril de 2024, mas a sua decisão de adiar as eleições meados de Dezembro não agradou à oposição e à sociedade civil, que rejeitaram um processo de “diálogo nacional”.
© Sylvain Cherkaoui | Associated Press | The San Diego Union-Tribune

No Senegal, há eleições, mas não se podem considerar “livres e justas”. E, tal como Burkina Faso, no Níger e no Mali, o sentimento anti-francês é cada vez mais forte. Se as instituições funcionam e oferecem aos governantes um certo “grau de legitimidade”, ao contrário do que acontece nos vizinhos sahelianos, certo é que os últimos anos têm sido marcados por grande contestação social, devido aos abusos atribuídos ao partido no poder, designadamente a perseguição de opositores políticos, fraudes eleitorais e violência policial.

Em 1 de Junho deste ano, eclodiram protestos em Dakar – pelo menos 15 pessoas foram mortas -, depois de o líder da oposição, Ousmane Sonko, ter sido condenado, à revelia, a 2 anos de cadeia por “corrupção da juventude”, o que o poderá desqualificar como candidato às presidenciais de Fevereiro de 2024.

O seu partido foi dissolvido – uma decisão sem precedentes desde que o país se tornou independente em 1960. Nas eleições de 2019, que deram um segundo mandato ao chefe do Estado, Macky Sall, Sonko ficou em terceiro lugar.

[Em Fevereiro de 2024, informa a BBC, Macky Sall decidiu abandonar o poder a 2 de Abril, mas o seu anúncio não diminuiu as tensões no país, sobretudo porque ele decidiu adiar eleições para meados de Dezembro. Dezasseis dos 19 aspirantes à presidência e várias organizações da sociedade civil e a oposição recusa participar no “diálogo nacional” que ele propôs.]

O único golpe na história do Senegal foi constitucional. Aconteceu em Dezembro de 1962, quando o primeiro chefe do Governo, Mamadou Dia, tentou sem êxito afastar o presidente, Léopold Sédar Senghor, no que o diário britânico The Guardian designou por “um caso clássico das dificuldades da divisão de poderes”, mas também de “divisões entre políticas liberais e radicais”.

Dia foi preso, julgado por traição e condenado a pena perpétua, mas em 1974 foi perdoado e em 1976 amnistiado. Morreu em 2009, aos 99 anos, amado como um “tesouro nacional”. O facto de não haver história de golpes militares não significa a inexistência deste risco, anota a Stratfor, mas tal exigirá uma “ruptura sem precedentes” entre as forças armadas e o governo.

Isaias Afwerki nunca implementou a Constituição da Eritreia que deveria garantir direitos aos cidadãos e limitar o poder executivo – pelo contrário, suprime as liberdades e a dissidência política, impõe o trabalho forçado e o recrutamento obrigatório de soldados por tempo indefinido.
© Ashraf Shazly | AFO | Getty Images | Newsweek

A Eritreia do presidente, Isaias Afwerki, de 77 anos, é descrita pela Human Right Watch como “a ditadura de um homem não eleito, sem uma legislatura, organizações da sociedade civil ou um sistema judicial independentes”.

Nunca este país da África Central realizou eleições desde que se separou da Etiópia em 1993, e Afwerki nunca implementou a Constituição que deveria garantir direitos aos cidadãos e limitar o poder executivo – pelo contrário, suprime as liberdades e a dissidência política, impõe o trabalho forçado e o recrutamento obrigatório de soldados por tempo indefinido.

Neste sistema repressivo, a morte ou incapacidade do tirano poderá gerar um ambiente de incerteza de que os militares se podem aproveitar, diz a Stratfor. Mesmo que ele tenha tempo de designar um sucessor, “será difícil a um novo homem forte, mais jovem, tentar dominar a rede de clientelismo de Afwerki”, sobretudo porque “o papel descomunal” que as forças armadas desempenham na política sugere que, nessa circunstância, muito provavelmente, irão intervir.”

Yoweri Museveni, presidente do Uganda, está há quatro décadas no poder, sempre a reprimir a oposição e a restringir as liberdades. O seu filho, general Muhoozi Kainerugaba, envolvido em escândalos vários, é considerado o provável sucessor.
© John Muchucha | AP | National Public Radio

No Uganda, Yoweri Museveni, de 79 anos de idade e quase 40 na chefia do Estado, enfrenta um “robusto movimento de oposição”, apesar dos seus esforços para reprimir todos os protestos populares, restringir liberdades e direitos.

Em 6 de Outubro, o principal rival de Museveni, a antiga estrela pop Bobi Wine (nome verdadeiro Robert Kyagulanyi), foi colocado sob prisão domiciliária depois de regressar da África do Sul.  Bobi Wine disputou as tensas eleições de 2021 e está já a preparar a campanha para afastar Museveni.

O filho de Museveni, general Muhoozi Kainerugaba, nascido há 49 anos em Dar-es-Salam, na Tanzânia, de onde o pai participou na luta de guerrilha contra a ditadura de Idi Amin, é considerado o provável sucessor.

No entanto, a tendência deste comandante das Forças Especiais – responsável pelas operações militares no Leste da República Democrática do Congo – para se envolver em escândalos e polémicas no Twitter – como a oferta pública de 100 vacas como “prémio de noivado” a Giorgia Meloni, futura primeira-ministra de Itália, ou a ameaça de “invadir” o Quénia, o que obrigou Museveni a pedir desculpas públicas – suscita dúvidas de que será capaz de manter as estruturas do regime. Isso poderá abrir a porta a uma luta interna pelo poder dentro das forças armadas.

Até que os governos africanos consertem os seus deficientes sistemas políticos e respondam aos anseios das populações, a democracia no continente permanecerá “uma aspiração que nunca será realizada”, avisou a presidente Samia Suluhu Hassan, da Tanzânia – um dos raros países do continente onde nunca ocorreu um golpe militar, mas onde a oposição é frágil apesar de eleições multipartidárias regulares desde o fim do regime de partido único, no início do anos 1990.

© Africa Defense Forum (ADF)

Este artigo, agora actualizado, foi publicado originalmente na edição de Novembro de 2023 da revista ALÉM-MAR | This article, now updated, was originally published in the November 2023 edition of the Portuguese news magazine ALÉM-MAR.

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