O autoritarismo voltou à Tunísia e ao Egipto. Na Síria, o tirano que a destruiu acaba de ser reabilitado. Na Argélia, fracassou a “Revolução dos Sorrisos”. No Sudão, dois generais rivais iniciaram uma nova guerra. As lutas populares iniciadas em 2011 têm vindo a ser enterradas, uma a uma. Os seus berços tornaram-se celas e caixões. (Ler mais | Read more…)

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Há dez anos, no dia 14 de Agosto de 2013, seis semanas depois de um golpe militar que derrubou Mohamed Morsi, o (primeiro) presidente eleito que sucedeu ao ditador Hosni Mubarak, entre 800 e 1000 pessoas foram mortas nas imediações da mesquita de Rabaa al-Adawiya, no Cairo. “Foi o pior massacre na história moderna do Egipto e acabou com a Primavera Árabe* – ou o que restava dela”, escreveu o académico Shadi Hamid na revista The Atlantic.
Nada teve de pacífico a “transição democrática” numa potência regional que serve de ponte entre o Norte de África e o Médio Oriente, e que vivia na época, segundo o egípcio Shadi, “um tempo de polarização, medo e incerteza”.
Morsi, um “apagado e incompetente” funcionário da Irmandade Muçulmana, escolhido como “pneu sobressalente” porque a candidatura de Khairat al-Shater, o homem forte da organização, havia sido desqualificada, obteve uma “pequena maioria” (51,73%) dos votos na segunda volta das eleições presidenciais, em Junho de 2012.

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Morsi prometeu governar para “todos os Egípcios”, mas, ao monopolizar o poder, conseguiu hostilizar todos os que não alinhavam com ele e a sua confraria islamista, cada vez mais dominante. Em 30 de Junho de 2013, milhões de egípcios encheram as ruas exigindo a demissão do presidente, descontentes como o seu rumo.
Em 3 de Julho, após três dias de protestos em massa, Morsi foi deposto e preso por Abdel Fatah El Sisi, o general que ele nomeara chefe das Forças Armadas e ministro da Defesa. Os apoiantes do primeiro civil chefe do Estado também se mobilizaram, e alegadamente armaram, para o defender. E neste pico de tensão foi cometido o massacre na praça de Rabaa, pelo qual grupos de direitos humanos culparam forças comandadas por Sisi.
O destino de Morsi deixou à vista de todos como a queda do raïs (líder) Mubarak, em 11 de Fevereiro de 2011, não representou a queda de um regime odiado. Em Junho de 2015, Morsi foi sentenciado à morte, no âmbito de um processo relacionado com uma fuga de prisioneiros durante a revolução de 25 de Janeiro.

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Em 16 de Novembro de 2016, aquela condenação foi levantada, mas mantiveram-se outras: 20 anos de cadeia, sem direito a liberdade condicional, pela morte de manifestantes durante confrontos em Dezembro de 2012; 40 anos por crimes de espionagem a favor do Qatar; e uma pena perpétua por ligações ao movimento palestiniano Hamas.
Em 17 de Junho de 2019 – seis anos exactos após a sua investidura e aos 67 anos de idade –, Morsi morreu, de ataque cardíaco, numa “jaula” de vidro “insonorizada para o silenciar”, onde comparecia perante os juízes sempre que deixava a “Prisão Escorpião”, uma ala especial da penitenciária de Tora concebida, segundo um dos guardas, “para que quem ali entrasse só morto de lá saísse” **. A família de Morsi foi obrigada a sepultá-lo num cemitério no Cairo, longe da sua província de Sharqiya.
Que contraste em relação ao tratamento reservado ao antecessor. Internado num hospital militar, Mubarak era conduzido ao tribunal de avião e numa maca. Em 2 de Março de 2017, foi ilibado de responsabilidade pelos quase 900 mortos vítimas da repressão nos primeiros dias da sublevação popular e, no dia 24, saiu da enfermaria para a sua mansão. Morreu aos 91 anos, em 25 de Fevereiro de 2020. Teve direito a um funeral de Estado, com todas as honras, e três dias de luto nacional.

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Apoiado pelos Emirados Árabes Unidos, determinados a conter a ascensão da Irmandade Muçulmana num país estratégico, o golpe de Abdel Fatah al-Sisi, agora marechal, transformou o Egipto numa vasta prisão. Em 2022, organizações não governamentais estimavam em “cerca de 60 mil o número de prisioneiros políticos – metade da população prisional”.
Nenhuma dissidência é tolerada e os que vão parar às velhas e recém-construídas prisões, tantas vezes sem julgamento, são mantidos em condições desumanas. Mais de mil morreram sob custódia. Sisi justifica a repressão com a necessidade de enfrentar uma ameaça maior, o jihadismo que continua activo na península do Sinai.
As promessas de prosperidade também têm sido vãs. O Egipto atravessa uma grave crise económica: a inflação subiu para 26,5% e a libra egípcia perdeu metade do seu valor face ao dólar norte-americano. O Fundo Monetário Internacional aceitou conceder um empréstimo equivalente a 2800 milhões de euros, mas exigiu reformas.
Sisi, envolvido em projectos megalómanos, como a construção de uma nova capital, assegurou que vai reduzir as despesas públicas e privatizar dezenas de empresas e bancos estatais. O problema, assinala o site DW, é que “uma grande parte da economia nacional está nas mãos dos militares e os seus modelos de negócio opacos assustam os investidores estrangeiros”. A situação é tão crítica que Sisi, descrito pela revista Foreign Policy como um ditador “muito pior do que foi Mubarak”, teve de engolir o orgulho e aceitar ajuda do Qatar – patrono de Mohamed Morsi e dos Irmãos Muçulmanos – porque outros financiadores não estão dispostos a arriscar.

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Há receios de que Kais Saïed, na Tunísia, esteja também a imitar Zine El Abidine Ben Ali, o ditador forçado ao exílio na Arábia Saudita, onde morreu no mesmo mês (Setembro) e no mesmo ano (2019) em que ele ganhou a presidência.
“Pouco tempo depois de Ben Ali conquistar o poder em 1987, as prisões do seu governo encheram-se de milhares de presumíveis opositores, muitos foram torturados e as suas famílias submetidas a abusos infindáveis”, lembrou Eric Goldstein, vice-director da Human Rights Watch. “A escala da repressão do passado ainda não é comparável à de hoje, mas Saied está a dois passos de imitar as tácticas de Ben Ali”, deposto em 2011, na primeira e mais promissora das “primaveras árabes”.
Jurista e académico aposentado, 65 anos, Saied concorreu às presidenciais como um “conservador independente”. Fez várias promessas, incluindo combater a corrupção e responder às reivindicações dos jovens, revoltados contra a classe política. Venceu a segunda volta com 72,7% dos votos. Um dos que apoiaram a sua candidatura foi o maior partido político tunisino, o islamista Ennahda, cujo líder histórico, Rached Ghannouchi, 81 anos, está agora na prisão, acusado de “conspiração contra a segurança do Estado”.

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O autoritarismo de Saïed tornou-se evidente quando, em Julho de 2021, demitiu o Governo, suspendeu o Parlamento presidido por Ghannouchi (para depois o dissolver em Março de 2022) e deu a si próprio poderes extraordinários, que lhe permitem governar por decreto.
O Ennahda e outros partidos denunciaram “um golpe”, mas as medidas presidenciais foram, de início, bem acolhidas por uma parte da população, descontente com a gestão da pandemia de covid-19 e uma grave crise económica.
Em 25 Julho, apenas três semanas após a sua publicação e sem debate público, foi referendado o projecto de uma nova Constituição, redigida à porta fechada, por um painel cujos membros foram designados por Saied. Com a participação de apenas 30,5% dos eleitores inscritos, a nova Constituição foi aprovada por 94,6% votos.
Estabelece um sistema presidencial semelhante ao que vigorava antes da “Revolução de Jasmim”; cria uma segunda câmara do Parlamento com membros eleitos por conselhos regionais e distritais – e não por sufrágio universal –, reduzindo drasticamente o papel da Assembleia dos Representantes do Povo; enumera muitos direitos, mas remove os mecanismos para a sua protecção; não garante a independência do sistema judicial.

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Em 15 de Setembro, Saïed modificou a lei eleitoral, também sem consulta pública. Ordenou a redução do número de deputados, de 217 para 161, permitindo que os eleitores votem em indivíduos e não em listas de partidos, diminuindo a influência destes. A nova lei já não impõe o princípio da paridade de género, que garantia a participação igual de mulheres.
Seguiu-se a convocação de eleições legislativas. A afluência às urnas foi de 8,8% na primeira volta (em Dezembro) e de 11,1% na segunda volta (em Janeiro de 2023) – uma abstenção recorde a nível mundial. Em Março, dias antes da inauguração do novo Parlamento, o presidente dissolveu os conselhos municipais (um terço dos quais eram controlados pelo Ennahda) e criou os conselhos regionais e distritais, que podem eleger a segunda câmara do Parlamento, desmantelando todo o processo de criação de instituições políticas.
Há uma “regressão das liberdades” na Tunísia, avalia a Human Rights Watch. Não é possível criticar as acções do presidente, do exército e da polícia. Numerosos dissidentes políticos, defensores dos direitos humanos, jornalistas, sindicalistas, utilizadores da redes sociais têm sido presos, alguns julgados em tribunais militares. Há fracturas nos campos de Saied e da oposição, o que dificulta a reconciliação.

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Num discurso recente, que a activista tunisina Sihem Bensedrine qualificou de “incendiário”, Saied insurgiu-se contra os migrantes subsarianos, responsabilizando-os por “violência, crimes e actos inaceitáveis”, considerando que “vagas sucessivas de imigração ilegal” fazem parte de uma conspiração para diluir a identidade árabe-islâmica e criar um “país puramente africano”. Esta linguagem inspirada na teoria racista da “grande substituição” incentivou de imediato agressões contra migrantes negros, muitos dos quais obrigados a abandonar o país.
“Na última década, tivemos eleições livres e justas, redigimos uma Constituição progressista [em 2014], construímos uma sociedade civil próspera, mas tudo está agora em perigo devido aos incessantes assaltos de Saied à democracia”, queixa-se Bensedrine, num artigo no diário britânico The Guardian.

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“Porquê este ódio racial? Em parte, porque a sua estratégia é desviar a atenção dos graves problemas económicos do país. [Entre 2021 e 2022, o crescimento retraiu-se, de 4,3 para 2,4%; os preços dos alimentos subiram 14,6%; o desemprego jovem chegou aos 38,8%]. No berço da Primavera Árabe, renasce uma ditadura, e o silêncio do mundo é ensurdecedor”.
“Saied é uma ameaça maior ao futuro da Tunísia do que foi Ben Ali”, destacou também, no site da Al Jazeera, o escritor tunisino Haythem Guesmi. “No esforço para silenciar os adversários, é mais agressivo e desequilibrado do que o predecessor. E ao contrário de Ben Ali, não teme atacar e arrasar as próprias fundações da nação para promover a sua agenda.”
O presidente “segue uma política de terra queimada, amplia a polarização, acentua as tensões raciais, promove o tribalismo e corrói a confiança dos cidadãos em instituições independentes. Passo a passo, vai transformando a Tunísia num Estado falhado.”

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A face autoritária de Saied revelou-se igualmente na decisão de restabelecer os laços com o regime de Bashar al-Assad, assim “enterrando as memórias, e talvez o legado”, diz a agência AP, da que era, até há pouco tempo, segundo Andrew Miller, do Project on Middle East Democracy, “a única história de sucesso da Primavera Árabe”.
Em Fevereiro de 2012, quando a revolução na Síria se transformou em guerra civil, a Tunísia que, nas palavras de Jeffrey Laurenti, do think-tank Century Foundation, “representava a vanguarda da mudança democrática contra os despotismos regionais”, foi o primeiro país da Liga Árabe a cortar relações bilaterais e a apoiar a oposição.
Em Maio deste ano, juntou-se a outros membros da organização na reabilitação de um tirano que, com a ajuda do Irão e da Rússia, destruiu o seu país para permanecer no poder: 6,8 milhões de sírios são refugiados e outros 6,9 milhões são deslocados internos.

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No Twitter, Charles Lister, director do programa sírio do Middle East Institute, mostrou-se indignado: “Assad matou 500 mil pessoas do seu próprio povo e fez desaparecer outras 130 mil, lançou 82 mil bombas de fragmentação, levou a cabo 340 ataques com armas químicas e dirige um narco-estado que vale dezenas de milhares de milhões de dólares. Claro, vamos dar-lhe um lugar na Liga Árabe! Isso resolve tudo.”
A realidade é que Assad só “controla 62% da Síria, e aqui apenas 20% dos recursos naturais do país”, explica Lister. Pelo menos “55% de cidadãos sírios [numa população pré-guerra de 23 milhões] fugiram das áreas sob controlo do regime – e, segundo a ONU -, menos de 0,5% considera regressar”.
A reintegração de Assad não foi unânime, nem sequer consensual, mas não se pode ignorar o peso do apoio da Arábia Saudita – outrora um dos principais financiadores dos rebeldes sírios – e dos Emirados Árabes Unidos (que deram o primeiro passo em 2018), porque a reaproximação a Damasco “serve os seus interesses”, como sublinha Lister.

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Uma das razões para Assad recuperar legitimidade é porque os seus pares lhe exigem que ponha fim ao lucrativo mercado de captagon, controlado pelo irmão Maher al-Assad, uma droga que está a desestabilizar as sociedades da Arábia Saudita, do Iraque e da Jordânia, onde tem sido confiscada.
Captagon é a marca comercial do cloridrato de fenetilina, que começou a produzir-se mundialmente em 1963, para a sonolência e a depressão, mas foi proibido na década de 1980 por ser altamente viciante, segundo a BBC.
Fabricadas em grandes quantidades na Síria e no Líbano, contendo anfetamina e cafeína, as cápsulas de captagon são conhecidas como a “droga dos jihadistas”, porque lhes “proporciona energia sobre-humana e coragem para superar o medo e a dor”.
Com a economia devastada pela guerra – 90% dos sírios vive abaixo do limiar da pobreza –, Bashar e Maher usam o captagon como forma de pressão para que sejam levantadas as sanções e retomados os investimentos internacionais, algo que poucos consideram possível.

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Para Charles Lister, no regresso da Síria à Liga Árabe, os únicos vencedores são Assad, “que vai continuar o tráfico de droga, não ofereceu nada em troca e foi recompensado com um ‘acordo’ de reconhecimento”.
O Irão, que “vê consolidada a agenda de política externa que segue há 40 anos e forçou os árabes a admitir derrota”; a Rússia, que há muito procurava legitimar Assad e agora demonstra “a irrelevância da Europa e dos EUA no Médio Oriente”; o Daesh, que, enfraquecido no Iraque e no Nordeste da Síria (graças aos curdos), “está a ressurgir nas áreas sob controlo de Assad”.
Os derrotados são todos os sírios. “Os refugiados e desaparecidos vão continuar a sê-lo, enquanto a corrupção, a brutalidade e o terrorismo prevalecerão, talvez durante décadas”, lamenta o investigador. “A mensagem é clara: ditadores, actuais ou futuros, e criminosos de guerra têm agora a prova concreta de que podem safar-se de assassínios em massa, que o mundo acabará por se cansar e deixará de prestar atenção e pedir contas.”

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Alguns viram o fracasso da partida e militarizada oposição síria como a certidão de óbito das sublevações de 2011, mas quando Omar al-Bashir, há três décadas no poder, foi derrubado pelos militares do Sudão, em 11 de Abril de 2019, depois de um ano de persistente luta popular, a revista Jacobin viu aqui “a confirmação de que o fermento revolucionário da Primavera Árabe não morreu”.
Até porque, dois meses depois, esta levedura fez crescer na Argélia o silmiya (pacífico) movimento Hirak, que forçou um octogenário, doente e invisível presidente, Abdelaziz Bouteflika, a renunciar a um quinto mandato, após 20 anos ao leme de um “regime militar de fachada civil”.
A euforia destes movimentos de protesto, com as mulheres na linha da frente, rapidamente murchou. Em Argel, o omnipotente exército lançou-se numa “contra-revolução” contra a “Revolução dos Sorrisos”, retomando campanhas de repressão e supressão da liberdade, referiu Zine Labidine Ghebouli, analista do Middle East Institute. O sistema judicial ameaçou antigos e emergentes partidos políticos, e dissolveu organizações da sociedade civil.

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Uma oposição “sem uma liderança clara e com profundas divergências ideológicas” foi incapaz de confrontar esta estratégia, e “a maioria silenciosa que apoiava o Hirak abandonou as ruas”. Com o país em crise sócio-económica, Ghebouli não antevê resolução para o impasse: “A Argélia de hoje não é a mesma do tempo de Bouteflika, mas permanece ambígua e as memórias dos traumas não resolvidos do passado continuam presentes.”
No Sudão, vive-se um pesadelo maior. A revolução que ajudou a derrubar Bashir foi atraiçoada em 25 de Outubro de 2021 quando um golpe de Estado pôs fim a uma coligação de civis e militares encarregada de preparar a transição para um futuro democrático.
Os golpistas – o chefe do exército nacional, Abdel Fattah al-Burhan, e o das Forças de Apoio Rápido (RSF, paramilitares), Mohamed Hamdan “Hemedti” Dagalo – assumiram o control, atribuindo-se os cargos de presidente e vice-presidente de um “Conselho de Soberania”.

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Em 15 de Abril, deitando por terra meses de negociações e incapazes de governar o país, cujas riquezas desavergonhadamente*** exploram, os generais rivais Burhan e Hemedti iniciaram uma guerra sem precedentes na capital (Cartum), que logo se alastrou a várias regiões, em particular à de Darfur, onde eles já haviam sido protagonistas de actos de violência genocida, que continuam a ser cometidos desde 2003.
Todos os acordos de cessar-fogo firmados pelos beligerantes têm sido quebrados e o número de vítimas continua a aumentar. Em 27 de Maio, o Escritório das Nações Unidas para a Coordenação de Assuntos Humanitários (OCHA) registava “pelo menos 730 mortos e cerca de 5500 feridos”.
Em sete semanas, “quase 1,4 milhões de pessoas foram obrigadas a sair de suas casas”, a grande maioria deslocadas internas (que se juntaram a mais 3 milhões já nesta condição) e as restantes (345 mil) refugiadas em países vizinhos.

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Sem fim à vista para este e outros conflitos – como o da Líbia, que ainda não encontrou estabilidade desde a queda do coronel Muammar Kadhafi, e o do Iémen, onde a reaproximação entre Teerão e Riade tarda a acabar com uma guerra que dura desde 2014 -, as análises dos especialistas no Norte de África e Médio Oriente tendem a ser pessimistas. Mas há excepções.
Farea Al-Muslimi, investigador na Chatham House, em Londres, recusa-se a perder a esperança. “Não podemos dizer que a Primavera Árabe foi em vão”, escreveu ele no diário britânico The Independent. “Embora as batalhas tenham sido vencidas por regimes autoritários e seus aliados, há uma geração que despertou politicamente e viu em primeira mão a fragilidade de ordens repressivas.
As forças da mudança têm de se reagrupar e encontrar novas abordagens e instrumentos para prosseguir a luta. Os esforços com vista a reformas democráticas devem merecer o apoio da comunidade internacional e não ser sacrificados no altar da conveniência política.”

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* A expressão “Arab Spring” (Primavera Árabe), que tem servido para caracterizar as revoltas populares no Médio Oriente e Norte de África, é atribuída ao escritor e académico Marc Lynch, que a usou num artigo publicado na “Foreign Policy”, em 6 de Janeiro de 2011. No entanto, já em 2005, como anota Joshua Keating na mesma revista, outros comentadores norte-americanos utilizavam a mesma expressão para explicar movimentos pró-democráticos naquela região, em particular os protestos contra a presença síria no Líbano, depois do assassínio do primeiro-ministro Rafiq Hariri.
** “Mohamed Morsi Died in a Soundproof Cage”, Mona Eltahawy, “New York Times”, 18 de Junho 2019.
*** Numa Entrevista à BBC, em 2019, Hemedti disse não ver conflito de interesses entre o seu cargo político e os seus negócios: “Não sou o primeiro dono de minas de ouro [no Darfur]”. O seu primo, num vídeo partilhado em 2022, vangloriou-se de pertencer a “uma das famílias mais ricas de África”.

© Hani Mohammed | Associated Press | World Politics Review
Este artigo foi publicado na edição de Julho-Agosto de 2023 da revista ALÉM-MAR | This article was published in the Portuguese news magazine ALÉM-MAR, July-August 2023 edition